Relações e Metamorfoses: O Amor que se Transforma.
“Liberdade é pouco. O que eu desejo
ainda não tem nome.”
— Clarice Lispector
Vivemos num mundo que ainda quer a mulher frágil, dócil, resignada. Um mundo onde o machismo não é apenas uma atitude individual, mas um sistema que estrutura famílias, cidades, países e corações. A mulher carrega feridas profundas — a violência doméstica, o abuso psicológico, o silenciamento — como se fossem marcas invisíveis de uma submissão naturalizada.
Mas não é natural.
É brutal.
É violência em nome do poder.
E não para por aí. A mulher que não se encaixa nos padrões de beleza — aquela que a sociedade rotula como “feia”, “estranha”, “excluída” — é traída de várias formas. Traída pelo olhar que rejeita, pelo afeto que se nega, pelo amor que se faz distante. Porque a beleza física virou moeda, status, passaporte para o afeto e para a aceitação social.
Essa mulher, que ousa existir fora do molde, enfrenta o desprezo silencioso.
É invisibilizada.
É ignorada.
É tida como menos desejável, menos amável, menos digna.
E mesmo dentro das relações mais próximas, essa traição se revela: o olhar que desvia, a distância que cresce, a violência velada que se instala.
Ainda hoje, no século XXI, milhares de mulheres são caladas pela dor, pelo medo, pela vergonha. São aprisionadas em lares que deveriam ser santuários, mas que viram prisões. São colocadas numa prisão emocional, num ciclo onde o amor é confundido com sofrimento, onde a força é confundida com violência, onde a liberdade é um luxo para poucos.
É nesse contexto que Clarice Lispector nos lembra:
“Liberdade é pouco. O que eu desejo ainda não tem nome.”
Porque, enquanto a mulher busca seu espaço, seu amor e sua força, ainda não há palavra suficiente para descrever a profundidade dessa luta — essa metamorfose que é também renascimento.
E é nessa realidade que a metamorfose precisa acontecer.
Não como sonho distante.
Não como desejo utópico.
Mas como revolução urgente.
Porque amar com força — como Simone de Beauvoir disse — não pode ser apenas um ideal para um futuro longínquo. Precisa ser o agora, a luta diária.
Amar com força é gritar contra o medo que tenta calar, é reconstruir o corpo após a violência, é retomar a palavra roubada. É desafiar o sistema que insiste em reduzir a mulher a um papel secundário, invisível.
Penso em Frida Kahlo, que mesmo sofrendo dores físicas e emocionais, pintava sua verdade com cores fortes, desafiadoras. Ela não pediu permissão para existir em sua totalidade — nem como mulher, nem como artista, nem como ser humano.
A metamorfose é esse processo de renascimento.
É um salto quântico dentro da alma, onde a menina que foi silenciada encontra a mulher que se recusa a ser domesticada.
Nesse processo, o amor não é mais risco de morte, não é prisão, não é renúncia.
O amor vira fonte.
Vira força vital.
Vira rebeldia e liberdade.
Por isso, no coração dessa metamorfose, a mulher encontra sua voz — e com ela, o poder de transformar não só suas relações, mas o mundo ao seu redor.
Que essa força seja o brado das próximas gerações,
o alicerce das mudanças verdadeiras,
a luz que nunca se apaga, mesmo diante da escuridão.
“Eu não sou nada. Nunca serei nada. Não posso querer ser nada. À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.”
— Clarice Lispector
Que esses sonhos sejam a semente da mudança,
a força que move cada mulher a reencontrar sua voz,
sua força,
seu amor.
Que a metamorfose aconteça aqui e agora,
em cada gesto de coragem,
em cada palavra dita,
em cada abraço dado a si mesma.
Porque só transformando a nós mesmas podemos transformar o mundo.
Que o amor com força seja o farol que ilumina nossos passos — uma revolução silenciosa, mas poderosa.
E assim, juntas, voaremos livres.
—
Sônia Lupion Ortega Wada
(Flôr da Cerejeira — Japão, 12/06/2025)