Sônia Lupion Ortega Wada
“Coragem é agir com o coração.”
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Na academia sem calcinha

 

 

Ela entrou na academia como quem sabe exatamente o que está fazendo.

Legging cor da pele. Justa. Marcando tudo: curvas, dobras, celulites — e, segundo rumores oculares, sem calcinha.

 

Sim, sem calcinha.

Ou pelo menos foi isso que metade da academia presumiu — a outra metade apenas fingiu que não notou.

Como se o cós da calça dissesse:

 

“Atenção: esta mulher não está aqui para sua aprovação estética.”

 

Para arrematar, um cinto dourado. Não desses de treino. Um cinto de quem malha e desfila.

De quem sabe que o espelho da academia não serve só para corrigir postura, mas para anunciar presença.

 

Eu moro no Japão. E, sinceramente?

Uma mulher usando isso aqui seria notícia. Manchete. Escândalo.

Talvez daqui a seiscentos anos o arquipélago aceite essa ousadia.

Por enquanto, ela seria considerada um terremoto com cinto.

 

Mas ali, no vídeo do YouTube, aquela mulher não recuava.

Não se escondia.

Não pedia desculpas por ocupar espaço com dobras, marcas ou ausência de forro.

 

Não era provocação.

Era existência.

 

 

Afinal, o que nos escandaliza?

 

 

A celulite? O volume? O bege atrevido da calça?

Ou o fato de alguém ousar viver sem filtros nem medo?

 

Estamos tão condicionadas a polir, esconder, disfarçar —

que quando alguém aparece com o corpo real e o ego intacto, tudo em nós range.

Como se fosse proibido ser visível sem ser perfeita.

 

Mas ela estava ali.

Como se dissesse:

 

“Tenho celulite, sim. E?

Estou sem calcinha, talvez. E?”

“Você que lute.”

 

 

A roupa como microfone

 

 

A academia, nos tempos de hoje, é mais do que espaço para suar.

É um palco.

De corpo. De estilo. De manifesto.

Ali se malham músculos — e às vezes, estruturas sociais.

 

O cinto dourado dela talvez não segurasse nada, mas significava tudo:

um toque de extravagância no lugar onde o mundo espera recato.

Talvez não fosse vaidade.

Talvez fosse um escudo.

 

 

E nós?

 

 

Se o que incomoda não é a calça, nem a celulite, nem a ousadia…

então o que é?

 

Talvez seja a coragem dela.

Coragem de se mostrar.

De desafiar o “não pode”.

De simplesmente existir como se fosse dona de si.

 

Talvez ela estivesse sem calcinha.

Mas nós é que estávamos nus —

despidos de coragem, cobertos de julgamento.

Sonia Lupion Ortega Wada
Enviado por Sonia Lupion Ortega Wada em 25/06/2025
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