Sônia Lupion Ortega Wada
“Coragem é agir com o coração.”
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CRÔNICA DE ANITA HARMON

Para os que seguem com os pés da alma.

 

Aonde seus pés dormem à noite?

 

Há uma ternura silenciosa no gesto de lavar os pés. Uma reverência miúda diante do sagrado que caminha ao nosso lado, mesmo coberto de poeira, calçado de cansaços.

 

Hoje, ao ler sobre os pés de Jesus — esses que não se intimidaram com o pó das estradas, nem com o peso do madeiro —, fiquei pensando nos meus próprios. Nos meus pés trêmulos, calejados de escolhas mal feitas e de silêncios engolidos. Nos pés que me levaram embora quando eu devia ter ficado. E também nos que me mantiveram firme quando tudo gritava por desistência.

 

Meus pés já se perderam em ruas sem nome e já voltaram, descalços, pelas vielas da esperança. Já correram por amor, já fugiram da dor. Já hesitaram. Mas sempre, de algum modo, encontraram o chão.

 

Há algo de profundamente humano nisso: continuar andando, mesmo sem mapa, confiando que haverá caminho onde o coração pisa. Que o chão se abrirá em estrada onde houver amor.

 

Pensei também nos pés da minha mãe. Quantas vezes os vi latejando, vencidos por um dia inteiro em pé, entre o tanque e o fogão. Nunca me ocorreu agradecê-los. Mas eles me ensinaram sobre sacrifício sem palavras.

 

E os pés da minha avó, que andavam lentos, quase cerimoniosos, como quem sabia que cada passo é um rito, uma oração.

 

Hoje, desejo que meus pés sejam humildes. Que saibam parar quando for hora de escutar. Que saibam se ajoelhar diante da dor do outro — não para mostrar piedade, mas para oferecer presença. Que saibam dançar nas festas simples da vida e caminhar firmes nas travessias mais duras.

 

Jesus, dizem, lavou pés. Mas creio que, antes disso, Ele lavou o orgulho do mundo.

 

Lavou as urgências, as pressas, as certezas. Lavou a arrogância dos que só sabem apontar. E nos deixou esse exemplo silencioso: amar é abaixar-se.

 

E você? Quando foi a última vez que agradeceu aos seus pés?

 

Talvez seja hoje. Talvez agora. Ajoelhe-se diante de si mesmo. Olhe seus pés com carinho. Eles têm carregado você há tanto tempo…

 

Que nossos passos sigam mansos, ainda que firmes. Que saibamos caminhar não para chegar, mas para servir. Porque há trilhas invisíveis que só o amor consegue revelar.

 

E há um rumor de eternidade no som de dois pés caminhando juntos — mesmo que em silêncio.

 

Com afeto,

Anita Harmon

entre passos, pedras e promessas

Sonia Lupion Ortega Wada
Enviado por Sonia Lupion Ortega Wada em 26/06/2025
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