Sônia Lupion Ortega Wada
“Coragem é agir com o coração.”
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CÂNCER DE MAMA —“Quando a Ciência Encontra a Fé: Minha Experiência com Keytruda, Quimioterapia Combinada e o Avanço no Tratamento do Câncer de Mama Triplo Negativo

 

“Leia isso não para me

abraçarem dó, mas para

abraçar sua própria travessia

com dignidade, informação e coragem.”

 

 

 

Prefácio: Para quem lê

 

Este texto nasceu do desejo de ajudar.

É para quem, um dia, ouve um diagnóstico difícil e pensa que não há mais caminhos — mas há.

 

Eu quero mostrar que fé, medicina, amizade e coragem podem caminhar juntas.

Que há novas possibilidades. Que cada corpo reage de um jeito, mas ter informação, apoio e esperança faz toda diferença.

 

Se minhas palavras chegarem a alguém que precise de força para perguntar, lutar ou simplesmente acreditar — já terão cumprido sua missão.

 

Não é um pedido de compaixão.

É um convite à confiança na vida.

 

Enquanto houver ciência, haverá esperança. Enquanto houver esperança, haverá flores.


Lembre-se: “A verdadeira cura acontece quando você se permite ser

Inteiro novamente (Mestre Hilarion)
 

 

Com carinho,

Sônia 🌸— Japão, 2025”

 



I. Introdução

 

 

 

Em abril de 2025, ouvi o que nenhuma mulher quer ouvir: “Você tem um carcinoma ductal invasivo triplo negativo, grau 3.”

Um tumor de 3,5 cm, agressivo, sem receptores hormonais para freá-lo.

Receber esse diagnóstico foi encarar a possibilidade real de morte — mas também foi o início de uma escolha: eu não seria espectadora passiva dessa história.

 

Escrevo este relato porque o que estou vivendo não é apenas uma narrativa pessoal: é um exemplo prático de como a ciência, a coragem de perguntar, o cuidado humanizado e o acesso a medicamentos novos podem dobrar as chances de resposta, até no câncer de mama mais temido.

 

 

 

 

II. O Diagnóstico — e o que significa ser Triplo Negativo

 

 

O Carcinoma Ductal Invasivo Triplo Negativo é conhecido por ser mais agressivo e imprevisível do que outros tipos de câncer de mama.

Ele não tem receptores hormonais (estrógeno e progesterona) nem HER2 para atacar com terapias-alvo tradicionais.

Por muito tempo, a única linha de combate era a quimioterapia clássica, com resultados limitados.

 

No meu caso, fiz todos os exames recomendados:

 

  • Biópsia core, para confirmar o subtipo histológico.
  • Ressonância magnética com contraste, para medir extensão e envolvimento de linfonodos.
  • Tomografia de tórax e abdômen, para investigar metástases.
  • Painéis de sangue detalhados para monitorar função hepática, renal, hemograma completo, marcadores tumorais.

 

 

Quando tudo ficou claro, eu não chorei. Perguntei ao médico, firme: “Quais as minhas chances? Qual o melhor protocolo para mim?”

Assumi meu lugar na decisão.

 

 

 

 

III. O Protocolo — quando imunoterapia encontra quimioterapia

 

 

Entrei em um protocolo ainda relativamente novo no Japão: 12 sessões combinando quimioterapia tradicional com imunoterapia (Keytruda, ou pembrolizumabe).

 

No meu folheto de tratamento, tudo é organizado por cores:

 

  • Verde — Keytruda: a imunoterapia, que estimula o sistema imune a identificar células tumorais que antes passavam despercebidas.
  • Azul — Paclitaxel (Taxol): droga quimioterápica que bloqueia a divisão celular.
  • Roxo — Carboplatina: quimioterapia à base de platina, agente citotóxico potente.

 

 

Essa combinação é poderosa, mas não é leve.

Até 3 anos atrás, o resultado era bem mais modesto: 30% das pacientes triplo negativas respondiam bem.

Hoje, com a combinação de Keytruda, a resposta chega a 60%.

Eu sou parte desses 60%: meu tumor já reduziu pela metade.

 

Essas 12 sessões são apenas a primeira etapa.

Depois, o Keytruda continua, mas entram drogas ainda mais potentes: Doxorrubicina ou Epirubicina (as “vermelhinhas”) e Ciclofosfamida, que age direto no DNA da célula doente.

Será uma segunda etapa, com 6 ciclos, mais fortes, mais espaçados, para eliminar o máximo de células residuais.

 

Depois disso, virá a cirurgia — com um marcador implantado na região do tumor, porque ele pode desaparecer quase totalmente com a químio, mas o cirurgião precisa localizar a raiz, o ponto exato.

E, por fim, a radioterapia, para limpar margens microscópicas e reduzir ao máximo o risco de recidiva.

 

É uma travessia longa, em camadas: veneno, corte, luz.

Cada fase tem sua dor — mas também sua esperança.

 

 

 

 

IV. As veias também adoecem

 

 

Cada sessão de químio não é só sentar na cadeira e esperar o veneno pingar.

É também cada exame de sangue, colhido toda semana, para monitorar glóbulos, rins, fígado.

São agulhas, seringas, punções que rasgam pele, veias, paciência.

 

Minhas veias já reclamam: duras, sensíveis, marcadas.

Por isso, minha oncologista recomendou colocar um cateter, o chamado “Port” (Poto, no Japão).

É um pequeno dispositivo, implantado sob a pele, ligado a uma veia central — para proteger as veias periféricas do braço.

Eu colocaria nesta semana, mas a febre alta e os efeitos colaterais fizeram adiar.

Proteger as veias também é proteger a dignidade de quem ainda tem muitas agulhadas pela frente.

 

 

 

 

V. Efeitos colaterais — o corpo que fala e resiste

 

 

Nenhum protocolo agressivo vem sem custo.

Metade do meu caminho até agora foi um ciclo de:

 

  • Febre alta, que me levou a ter um CRP de 21,5, indicador de inflamação grave.
  • Infecção urinária, internação, soro na veia.
  • Constipação severa, depois diarreia.
  • Queda total de cabelo e sobrancelhas — a única vez em que chorei. Vi meus fios indo pelo ralo como se eu perdesse uma parte de mim. Chorei, respirei, segui.

 

 

Houve dores musculares, calafrios, arritmia leve, fraqueza extrema.

Mas cada sintoma é um lembrete de que o corpo está lutando, metabolizando venenos que matam células ruins — e, infelizmente, também as boas.

 

 

 

 

VI. O suporte invisível — rede de afeto, fé e comida

 

 

Sobreviver a esse tratamento não é só química.

Meus amigos foram outra parte do protocolo:

Jhorei, Reiki, missas, mensagens de luz, haicais, poesia.

Uma amiga foi até Fátima, em Portugal, acendeu uma vela com meu nome. Enquanto eu tremia de febre no Japão, uma chama ardia por mim do outro lado do mundo.

 

E teve o que os japoneses chamam de shokuji ryōhō (terapia alimentar): mingau de arroz, ochazuke, chá de gengibre, comida de verdade — tudo para proteger rins, fígado, intestino.

Respeitei meu corpo como respeitaria um templo.

 

 

 

 

VII. O que meu corpo prova — de 30% a 60%: um salto

 

 

No início, quando ouvi “Triplo Negativo”, parecia uma sentença.

Hoje, depois de 6 sessões, meu tumor já regrediu 50% — e isso é parte de um avanço que não é só meu: a ciência tornou possível dobrar as chances de resposta em apenas 3 anos.

 

O problema? Keytruda ainda é raro, caro, inacessível para muitas mulheres no Brasil, onde o SUS não cobre imunoterapia combinada em todos os casos de câncer de mama.

Por isso escrevo: para profissionais de saúde, gestores públicos, pacientes e familiares — todos precisamos saber que a ciência evoluiu, mas o acesso ainda não acompanha esse salto.

 

 

 

 

VIII. Reflexão final — o que ninguém me tira

 

 

Nunca me deixei tombar pela depressão.

Não romantizo: chorei só uma vez, quando vi o cabelo caindo. Mas nunca perdi a dignidade de perguntar, de entender cada exame, de respeitar meu corpo.

O veneno me destrói, mas também me reconstrói.

A fé me embala, mas não me cega.

A ciência avança — e eu sou prova viva desse salto de 30% para 60%.

 

Se posso dar um conselho a quem está começando essa travessia, é este:

não deixe que a quimioterapia roube tudo de você.

Não viva só o laudo — viva também o dia.

 

Tenha um passatempo: escreva, cuide do seu jardim, borde, pinte, colecione flores no peito.

Medite — mesmo que seja só ouvindo o silêncio.

Mantenha os amigos por perto — mesmo que não consiga falar.

O abraço também pode ser silêncio.

 

Enquanto meu tumor diminui, minha voz cresce.

Enquanto a ciência evolui, minha fé floresce.

Minhas veias cansam, mas sei que o Port virá como cuidado a mais.

Quando o médico abrir, vai encontrar a raiz do tumor — mas também a raiz da minha coragem.

Talvez eu não veja a cura definitiva — mas meu corpo já carrega o futuro que virá para outras.

Talvez eu não salve o mundo — mas cultivo um jardim dentro de mim.

 

E isso, ninguém me tira.

 

 

 

Sônia 🌸— Sobrevivente em andamento.

Japão, 2025

Sonia Lupion Ortega Wada
Enviado por Sonia Lupion Ortega Wada em 03/07/2025
Alterado em 04/07/2025
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