Flutuação de Arroz
Eu queria ser passo
leve como quem roça o arroz
num campo de brancura
sem vincar o avesso do papel.
Sonhava ver o mundo
pelas pálpebras fechadas —
translúcido,
um lago onde o silêncio pousa
sem levantar ondas.
Queria desenhar nuvens
em porcelana de céu
e atravessar o meio-dia
como quem pisa brasa
sem fazer chama.
Mas a saudade,
essa é ave de espora,
cavalo que não aceita rédea —
arrasta meu peito
num trote de fogo manso,
derrama minhas pegadas
onde o arroz ainda cresce.
E mesmo assim,
eu flutuo:
grão entre dedos de vento,
marca de nada
no dorso do dia.
by Sônia🌸
Imagem: acervo particular da Autora.