Carta de Anita Harmon
Perfume de Outono
Haicai 1 – forma clássica (5-7-5):
Folhas no chão vão,
sob o casco do cavalo
soltam seu perfume.
Hoje caminhei por uma estrada de terra batida, tão antiga que parecia feita de lembranças. Ao meu lado, um cavalo seguia em silêncio, como se também respeitasse o que o outono tem de sagrado.
O chão estava coberto de folhas secas de álamo. Pequenas embarcações douradas que um dia navegaram nos ventos e agora repousavam, humildes, sobre a terra.
Quando o cavalo pisava nelas, ouvi um som suave — como papel de seda sendo dobrado com cuidado — e então, como um sussurro vindo da infância da floresta, um perfume se erguia.
Pisa o cavalo —
o outono exala segredo
nas folhas douradas.
Sim, as folhas, mesmo mortas, soltavam seu cheiro. Um aroma terroso, doce, talvez uma última tentativa de dizer:
“Estive viva. Fui sombra. Fui abrigo. Fui dança ao vento.”
Pensei então: será que também exalamos nosso perfume mais íntimo quando pisam sobre nós?
Será que a dor — quando vem com o peso dos cascos da vida — também nos extrai um cheiro essencial, invisível, mas marcante, que fica no ar para quem souber sentir?
Hoje aprendi que até as folhas esmagadas têm algo a oferecer ao mundo.
E que o silêncio do cavalo, ao pisar nelas, é mais respeito que descuido.
Guardei uma folha no meu caderno.
Se um dia ela perder o perfume, que reste ao menos o gesto de tê-la amado.
Com carinho,
Anita Harmon
Verso livre lírico:
As folhas dos álamos
jazem quietas sobre o chão de outono.
Quando o cavalo passa,
seu casco desperta perfumes antigos —
como se as árvores
ainda suspirassem por dentro.